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China e Hong Kong: Uma Relação de Conflitos e Resistências


Tsuji, Keith. 2019



Resumo


A relação entre China e Hong Kong é instável há muito tempo, com suas origens datando do século XIX na chamada Primeira Guerra do Ópio. Para o governo chinês, Hong Kong faz parte de seu território, e a resistência que a população da ilha demonstrou nos últimos tempos é só mais um capítulo de uma história extensa de guerras, drogas e riqueza.

Palavras-chave: China; Hong Kong; Primeira Guerra do Ópio.



Introdução


A relação entre China e Hong Kong é instável há muito tempo, com suas origens datando do século XIX na chamada Primeira Guerra do Ópio. Para o governo chinês, Hong Kong faz parte de seu território, e a resistência que a população da ilha demonstrou nos últimos tempos é só mais um capítulo de uma extensa história de guerras, drogas e riqueza.

Recentemente, a tentativa do governo local de aprovar uma emenda à legislação criminal que permitiria a extradição de fugitivos para serem julgados em outros países, inclusive para a China continental, foi o estopim para mais um conflito. Para o governo de Hong Kong, que propôs a lei, tratava-se de uma forma de evitar que o território se torne um refúgio de criminosos.

Porém, a população local tinha grande preocupação de que isso pudesse ser utilizado pelo governo da China para conseguir prender opositores políticos. Não seria a primeira vez que o governo chinês continental tentaria tomar controle da ilha, e é esse contexto histórico que será analisado no artigo, com o objetivo de entender os recentes desdobramentos na região.



Contexto Histórico


O comércio durante o século XIX na Inglaterra foi amplamente regido pela demanda de seda, chá e porcelana, todos importados principalmente da China. Essa demanda deixou a balança comercial tão desregulada que a Inglaterra precisou encontrar um bem que fosse tão demandado quanto os itens chineses: e a resposta para isso foi o ópio.

Apesar de ilícita, a droga era muito consumida por diferentes classes sociais da China já havia muitos anos. A estratégia adotada pela Companhia Britânica das Índias Orientais foi relativamente simples: produzir ópio na Índia, onde era mais barato, e vender para contrabandistas chineses. Essa tática facilitou o acesso à droga pela faixa mais pobre da população, permitiu que a Companhia tivesse prata o suficiente para atender a demanda de produtos da China e deixou o governo chinês com todo o problema social do uso de droga por grande parte da população.

A tentativa do governo chinês de resolver o problema resultou na Primeira Guerra do Ópio, com a Inglaterra sendo vencedora. Mesmo com a assinatura de um tratado de paz em 1842, que tratava da cessão da ilha de Hong Kong para a Inglaterra, as tensões sobre acabaram e outro conflito foi desencadeado em 1856. A Segunda Guerra do Ópio também foi vencida pelos ingleses em 1860, e outro tratado foi assinado. Pela Convenção de Pequim, territórios adjacentes a Hong Kong também seriam cedidos aos ingleses pelo período de 99 anos a partir de 1898.

Em 1984, faltando 13 anos para o término da cessão, os governos britânico e chinês assinaram a Declaração Conjunta Sino-britânica, que estabelecia as regras para a transição da região do domínio inglês para o chinês. Para adaptar a transição de uma região que foi construída em um regime capitalista para um regime socialista, o governo chinês decidiu, sob o lema “um país, dois sistemas”, que Hong Kong se tornaria uma região administrativa especial que poderia praticar o capitalismo com certa autonomia por 50 anos a partir da reunificação com a China. (Exame, ago 2019)

Porém, viver por mais de 150 anos como território inglês moldou a visão dos habitantes de Hong Kong de uma forma que talvez seja irreversível.



Conflitos Recentes


No início de 2019 o Governo de Hong Kong propôs um projeto de lei de extradição. O objetivo desta emenda à legislação era permitir a extradição de fugitivos para serem julgados em outros países, inclusive para a China continental. A emenda foi proposta em resposta a um homicídio envolvendo um casal de Hong Kong em Taiwan, e seria um mecanismo do Governo para evitar que a região se tornasse refúgio de criminosos.

A população, por sua vez, temia que o projeto de lei fizesse com que a cidade ficasse ao alcance da lei chinesa, deixando os cidadãos de Hong Kong sujeitos a um sistema legal diferente. A lei permitiria às autoridades locais deter e extraditar pessoas que são procuradas em territórios com os quais Hong Kong não possui acordos de extradição, o que inclui Taiwan e, principalmente, China continental.

Ao longo de 2019, vários protestos foram realizados em Hong Kong pelo público em geral e pelas comunidades legais. Entre eles, o protesto realizado em 9 de junho pela Frente Civil de Direitos Humanos (FCDH), que a organização estima que teve a participação de 1.03 milhão de pessoas, teve grande destaque na mídia. Em 12 de junho, os protestos do lado de fora do Conselho Legislativo acabaram em confrontos violentos entre a polícia e os manifestantes, com pelo menos 79 pessoas feridas (G1, nov 2019).

Em resposta aos protestos, o governo anunciou que o projeto havia sido suspenso por tempo indeterminado, apesar de não ter sido descartado. Os protestos continuaram ao longo de 2019 e no ano seguinte, e em 21 de maio de 2020 o Comitê Permanente do Congresso Nacional do Povo (NPCSC) começou a redigir uma nova lei que abrangeria "secessão, interferência estrangeira, terrorismo e subversão contra o governo central", confirmando assim a promulgação da Lei de Segurança Nacional (Isto É, mai 2020).



Lei de Segurança Nacional


Um pouco mais de treze meses depois da promulgação, em julho de 2021, a Justiça de Hong Kong anunciou o primeiro condenado com base na Lei de Segurança Nacional: Tong Ying-kit é um garçom de 24 anos que participou dos vários protestos dos últimos dois anos e foi condenado por carregar uma mensagem ilegal que seria "capaz de incitar outras pessoas a cometerem um ato de secessão" (G1, jul 2021).

Segundo a sentença, o jovem avançou com sua moto em cima de policiais e "colocou a segurança pública em grave perigo". O julgamento aconteceu em 15 dias e sem júri, com três juízes que foram designados pelas autoridades locais para julgar os crimes, por serem classificados como de segurança nacional.

Ying-kit foi uma das poucas pessoas de fato presas por atos violentos: mais de 60 pessoas já foram acusadas com base na lei, inclusive os principais ativistas pró-democracia de Hong Kong, como o bilionário Jimmy Lai, dono do jornal Apple Daily, que encerrou atividades após ser alvo de operações policiais (G1, jun 2021). Todos os acusados ainda aguardam julgamento.



Conclusão


Ao que tudo indica, a situação em Hong Kong tende a piorar: o governo chinês parece determinado a desafiar o Ocidente em busca de autonomia total sobre o que considera seus territórios. O maior obstáculo que a China enfrenta são os Estados Unidos que, após a eleição de Joe Biden, voltou suas atenções ao gigante asiático: Wendy Sherman, vice-secretária de imprensa de Estado, se reuniu com autoridades chinesas e repercutiu as preocupações que os EUA têm com o país, principalmente com a repressão a Hong Kong e ainda com crimes de genocídio contra humanidade em Xinjiang, abusos no Tibete e contenção de acesso à mídia, assim como a questão ambiental (Bem Paraná, jul 2021).

O governo chinês também acusa os EUA e a União Europeia de manter o que eles chamam de política perigosa em relação à China: a acusação seria de que o Ocidente, liderado por EUA, OTAN e União Europeia, estariam coordenando ataques cibernéticos contra os chineses. O vice-ministro do país, Xie Feng, também proferiu palavras duras durante o encontro com Sherman, e acusou os EUA de sempre exigir cooperação quando quer algo (El País, jul 2021).

Essas indisposições não dão indícios de que serão resolvidas em um futuro próximo, e Hong Kong pode acabar se tornando uma janela para o mundo ver quais são as pretensões chinesas. Só nos resta esperar para ver.



Referências Bibliográficas


DUTRA, Luiz Filipe Couto. Até onde vai o conflito entre China e Hong Kong? Exame, ago 2019. Disponível em: <https://exame.com/blog/negocios-da-china/ate-onde-vai-o-conflito-entre-china-e-hong-kong/> Acesso em 30 jul 2021.


Jornal pró-democracia de Hong Kong anuncia seu fim após ser alvo de operações. G1, jun 2021. Disponível em: <https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/06/23/jornal-pro-democracia-de-hong-kong-anuncia-seu-fim-apos-ser-alvo-de-operacoes.ghtml> Acesso em 30 jul 2021.


Justiça de Hong Kong anuncia 1ª condenação com base na lei de segurança nacional da China. G1, jul 2021. Disponível em: <https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/07/27/justica-de-hong-kong-anuncia-1a-condenacao-com-base-na-lei-de-seguranca-nacional-chinesa.ghtml> Acesso em 30 jul 2021.


LIY, Macarena Vidal. Acusações de ataques cibernéticos agravam as tensões entre a China e o Ocidente. El País, jul 2021. Disponível em <https://brasil.elpais.com/internacional/2021-07-20/acusacoes-de-ataques-ciberneticos-agravam-as-tensoes-entre-a-china-e-o-ocidente.html> Acesso em 30 jul 2021.


LIY, Macarena Vidal. China acusa EUA de manterem política “extremamente perigosa” e diz que relação está em “ponto morto”. El País, jul 2021. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/internacional/2021-07-26/china-acusa-eua-de-manterem-politica-extremamente-perigosa-e-diz-que-relacao-esta-em-ponto-morto.html> Acesso em 30 jul 2021.


MARINHO. André. Casa Branca reitera 'preocupações' sobre China, como Hong Kong e direitos humanos. Bem Paraná, jul 2021. Disponível em <https://www.bemparana.com.br/noticia/casa-branca-reitera-preocupacoes-sobre-china-como-hong-kong-e-direitos-humanos-479#.YQNuWH3PzIU> Acesso em 30 jul 2021.


Protestos em Hong Kong: o que está acontecendo no território, explicado em 3 minutos. G1, nov 2019. Disponível em: <https://g1.globo.com/mundo/noticia/2019/11/18/protestos-em-hong-kong-o-que-esta-acontecendo-no-territorio-explicado-em-3-minutos.ghtml> Acesso em 30 jul 2021.


PURCHIO, Luisa. A volta dos protestos em Hong Kong. Isto É, jul 2020. Disponível em: <https://istoe.com.br/a-volta-dos-protestos-em-hong-kong/> Acesso em 30 jul 2021.


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