Política do Terceiro Filho: A Nova Medida do Planejamento Familiar Chinês
- Jessica da Silva Rodrigues
- 1 de jul. de 2021
- 8 min de leitura

Cooper, Sheldon. 2021
Resumo
A China é o país mais populoso do mundo. Em 1950, tinha 554 milhões de habitantes, no início da década de 1970, passou a ter cerca de 900 milhões e, atualmente, 1,44 bilhão de habitantes chineses estão sob o controle do Presidente da República Popular da China, Xi Jinping. Ao analisar a demografia da China, é possível asseverar uma oscilação, que anos após, ocasionou o decrescimento e o envelhecimento da população. Dessa forma, noutro tempo, a explosão populacional era temida. Agora, a implosão populacional, devido à queda da taxa de natalidade, é a maior preocupação demográfica que desassossega a liderança socialista chinesa. Portanto, como resposta ao envelhecimento populacional causado por planos antecedentes, a “Política do terceiro filho”, apresentada regionalmente e globalmente, propõe-se a reverter o quadro etário chinês.
Palavras-chaves: China; demografia; envelhecimento; natalidade; família; filho.
Referencial Teórico
Para compreender a recente mudança nas diretrizes do planejamento familiar chinês, é importante entender a origem da reforma e das demais políticas que antecederam a “Política do terceiro filho”. Isto posto, o artigo, primeiramente, apresentará uma breve narrativa acerca da origem dos antecedentes elencados e, após, mencionará sobre a atual política estatal, anunciada em maio de 2021.
A origem das reformas de planejamento familiar originou-se na China em razão da estabilidade da sociedade, melhoria do sistema médico e desenvolvimento da produção, que foi estabelecido no país como consequência da fundação da República Popular da China. Na época em questão, a taxa de mortalidade foi diminuída ativamente, enquanto a população, por sua vez, cresceu rapidamente, caracterizando o fenômeno de “alto crescimento” (STATE COUNCIL, 1995). Com a finalidade de equilibrar o quadro, a partir da década de 1970, o Estado declarou uma série de políticas de controle populacional diante de um pensamento consciente acerca do inchaço excessivamente rápido da população; a autoridade administrativa chinesa constatou que a grande taxa de natalidade era desfavorável para o desenvolvimento econômico e social do país. Partindo deste parâmetro, em 1971, diante de um período de pico de nascimento, em que a sociedade passou a abranger quase 900 milhões de chineses, surgiu a campanha de planejamento familiar, que alojou programas de educação e campanha de distribuição de contraceptivos, além de exigir que houvesse o intervalo de pelo menos quatro anos entre o nascimento de cada filho de um casal. Ademais, era recomendado que fosse adotado um tamanho pequeno de família (dois filhos para domicílios urbanos e três filhos para famílias rurais) (STATE COUNCIL, 1995). A política adotada pelo presidente Mao Tsé-tung, ficou conhecida como “Mais Tarde, Mais Tempo e em Menor Número” (em chinês: “Wan, Xi, Shao”) (ALVES, JED, 2021).
Apesar do plano que agilmente reduziu o nível de nascimentos anuais, ainda havia a incompreensão do corpo social chinês a respeito do problema populacional. Então, como resposta à falha da campanha de planejamento familiar, no Quinto Congresso Nacional Popular, que ocorreu em 1979, com o propósito de conter mais rapidamente o crescimento de natalidade no país asiático, Deng Xiaoping instituiu a “Política do filho único”, a qual foi outorgada em 1980. Inicialmente, a reforma tinha como foco o maior grupo étnico do país, o Han. À vista disto, a minoria étnica usufruía da política de forma relaxada. De acordo com o Conselho de Estado da República Popular da China, a política tinha como finalidade o controle do crescimento da população e a melhoria da qualidade de vida, com o intuito de tornar a nação próspera e feliz. Fazendo jus ao objetivo, a reforma fundamentou o desenvolvimento favorável da economia do país e, consequentemente, gerou a melhoria dos padrões de vida, promovendo qualidade no que tange o âmbito da educação e da saúde. Entre os anos de 1949 a 1990, a expectativa de vida dos cidadãos saiu de 35 anos e atingiu 68,55 anos. A atenção destinada aos serviços educacionais facultou a educação obrigatória de forma sistemática, a qual possibilitou, já em 1994, a universalização da educação básica em áreas com 91% da população do país e a queda de 7% da taxa de analfabetismo de jovens e adultos (STATE COUNCIL, 1995). É significativo também a aceleração da erradicação da pobreza na área rural, que progrediu, inicialmente, por intermédio da política e da economia provinda desta. Desde o ano de 1978, o Estado unipartidário adotou medidas em pró da parcela da sociedade que vivia abaixo da linha da pobreza. Deste modo, no ano de 1978, 770 milhões de habitantes estavam sob condições miseráveis no território chinês. No ano de 2018, após o fim da “Política do primeiro filho” e ao decorrer da “Política do segundo filho”, apenas 16,6 milhões de chineses se encontravam em situação econômica precária (CABUHY, MELISSA. 2020). Já no mês de fevereiro de 2021, o secretário-geral do PCC, Xi Jinping, informou que a incidência da pobreza rural foi superada e, assim, a China atingiu a meta de erradicação da pobreza 10 anos antes do prazo definido na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (XINHUA, 2021).
Apesar das melhorias que procederam da “Política do primeiro filho”, a nação se deparou, ao passar dos anos, com a diminuição da população jovem como efeito da reforma. Desta maneira, a fim de estabelecer o embasamento da informação, a tabela a seguir, extraída do documento oficial das Nações Unidas, demonstra que houve um decréscimo de habitantes entre 0-15 anos e 15-24 anos, durante o período do plano estatal.
Ao se deparar com a diminuição do povo jovem e, consequentemente, com o aumento do envelhecimento da população, Xi Jinping lançou novas reformas em busca de reequilibrar a estrutura demográfica chinesa. Assim, em 2013, foi permitido que os casais tivessem o segundo filho, se ambos os pais fossem filhos únicos (XINHUA, 2021). No final do ano de 2015, o Congresso Nacional Popular outorgou uma emenda de lei de planejamento familiar, ao implementar a "Política universal de dois filhos”, que concedeu a permissão de que todos os casais tivessem dois filhos, estabelecendo oficialmente o fim da “Política de um filho”, que durou mais de 30 anos (PAN;LIU, 2020).
No entanto, diferente do esperado, não ocorreu um “boom” de nascimentos. Segundo o censo apresentado pela ONU, em 2016, a taxa de natalidade da China foi de 12.241, e em 2017, a taxa foi de 12.086. Semelhante aos últimos dois anos citados, os anos seguintes também compartilharam uma sequência de decrescimento; no ano de 2018, houve uma queda de 1,29% em relação a 2017, em 2019, a porcentagem caiu 2,15% em relação a 2018, o ano de 2020 presenciou a queda de 2,2% em relação a 2019 e, por fim, neste ano (2021), houve uma queda de 2,25% em relação a 2020.
A queda de nascimentos no país mais populoso do mundo fez o governo chinês alterar, novamente, a política de planejamento familiar. A transição da “Política do segundo filho” à “Política do terceiro filho”, foi estabelecida na reunião do Comitê Central do Partido Comunista da China (PCC), comandada por Xi Jinping, que revisou o plano estatal em pró do crescimento populacional equilibrado. O anúncio da nova política se deu por intermédio da agência de notícias oficiais “Xinhua”, em 31 de maio de 2021.
A “Política de dois filhos” causou um maior impacto no envelhecimento da população. Portanto, a ideia da República Popular da China é utilizar a “Política do terceiro filho” como estratégia para enfrentar o efeito negativo citado. O governo considera o plano significativo para o desenvolvimento nacional e bem-estar dos cidadãos, uma vez que a decisão preza o crescimento populacional equilibrado, que é importante para alcançar o auge do desenvolvimento econômico e a estabilidade social.
Considerando que a População em Idade Ativa é essencial para a realização de atividades econômicas, é alarmante a discrepância entre a quantidade de idosos e de jovens no território de 1,44 bilhão de habitantes; enquanto a tendência populacional de envelhecimento se intensificou, a oferta na força de trabalho na China diminuiu (GLOBAL TIMES, 2021). Posto isto, como resposta ao problema, a “Política do terceiro filho” propõe-se a melhorar a questão etária e aumentar a oferta de força de trabalho, alegou a Comissão Nacional da Saúde (NHC).
O planejamento familiar chinês chama a atenção de analistas demográficos. Diante disto, o professor da Escola de Sociologia e Estudos Populacionais da Universidade Renmin, Du Peng, ao analisar a escolha do Estado chinês, disse ao Global Times, no dia 31 de maio que “A política de três filhos ao lado de futuras políticas sociais e econômicas ajudaria a desacelerar o problema de aprofundamento do envelhecimento da China, pois poderia aumentar o número de futuros trabalhadores e equilibrar ainda mais o desenvolvimento da população”. Em conformidade com o pensamento do professor, o governo anunciou uma série de políticas sociais e econômicas para responder ativamente ao envelhecimento populacional maciço. De acordo com as informações contidas na imprensa estatal, Xinhua, a mudança na política de nascimento acompanhará medidas sistemáticas de apoio ao casal e crianças, para reduzir os enclaves enfrentados pelas pessoas que quiseram ter seu primeiro ou segundo filho, incluindo: a educação e a orientação para promover o casamento e os valores familiares entre os jovens em idade de casamento, a melhoria dos serviços de assistência pré-natal e pós-natal, o desenvolvimento de um sistema universal de serviços de cuidado infantil, a redução dos gastos familiares com educação, o aumento de oferta à educação, o fortalecimento do apoio fiscal e à moradia e a salvaguarda dos direitos e interesses legais das mulheres trabalhadoras.
Considerações Finais
Ao dar início à série de planejamento familiar, o Estado chinês não presumiu a drástica mudança na pirâmide etária do país. Uma vez que, apesar da concretização das metas estabelecidas no documento de 1995, assegurado pelo Conselho de Estado da República Popular da China, é visto, com base nos últimos censos divulgados que, embora a qualidade de vida dos cidadãos e a economia tenha melhorado, o controle de crescimento populacional falhou ao causar o desequilíbrio etário, ao resultar a grande tendência de envelhecimento da população e a queda da taxa de natalidade.
Dessa forma, a autoridade chinesa enfrenta um grande desafio para quebrar a sequência de declínios anuais de taxa de natalidade, que ameaça a prosperidade econômica, dado que, o grupo jovem é o ator predominante das atividades econômicas. Assim, a “Política do terceiro filho”, apresentada juntamente com as medidas econômicas e sociais de apoio ao casal e à criança, é a nova estratégia de Xi Jinping; a mudança nas diretrizes do planejamento familiar busca a mudança de cenário, ao ambicionar a eficácia da política e das medidas de apoio, para então, consolidar, no território chinês, o desenvolvimento econômico, a estabilidade do corpo social e o embate ao envelhecimento populacional.
Referências Bibliográficas
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