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O CENÁRIO ATUAL DA CIÊNCIA NO ÂMBITO NACIONAL

Palavras-chave: Ciência, tecnologia, pesquisa, fake news, divulgação, investimento, cientistas, condenação.

Divulgação/Marcha pela Ciência
Divulgação/Marcha pela Ciência

Se tivéssemos que resumir uma característica da ciência brasileira em uma única palavra, seria resiliência. Pelo menos, é isso que Hernan Chaimovich, professor emérito do Instituto de Química da USP e coautor de um relatório especial da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), acredita. Ainda segundo ele, há um porém: A resiliência tem limite.


Financiamento

Não é novidade que os cientistas brasileiros estão acostumados a fazer as coisas com muito pouco. Apesar do país possuir instituições de ensino que estão entre as melhores do mundo, como USP, Unifesp e UFRGS, existem dificuldades estruturais que limitam o avanço científico e tecnológico e impedem o país de atingir todo seu potencial.

Uma das principais causas de preocupação é a escassez de recursos financeiros -  sem investimento não se pode fazer ciência - orçamento destinado à área sofre com cortes constantes, prejudicando a compra de equipamentos, manutenção de laboratórios e a realização de pesquisas de longo prazo. A burocracia, que atrasa a liberação de recursos e importação de materiais necessários para pesquisa, é outra pedra no sapato das instituições e seus pesquisadores.

Apesar disso, o Brasil tem contribuições relevantes em áreas como agronomia, ciências da vida e energias renováveis; podemos destacar também a expressiva participação brasileira nas pesquisas sobre Inteligência Artificial: um levantamento divulgado este ano mostra que o país ocupa o 13º lugar no ranking de publicações acadêmicas sobre o assunto, nos colocando como o principal polo de IA na América Latina. Isso foi constatado em um estudo chamado O Panorama Brasileiro da Ciência, Tecnologia e Inovação em Inteligência Artificial, que segundo Luciano Nascimento, repórter da Agência Brasil, “foi encomendado pela Embaixada dos Países Baixos e tem como objetivo mostrar o avanço brasileiro no campo da IA, abordando temas como políticas e regulação, estimativas de investimentos públicos e privados, mapa dos centros de pesquisa, além de dados sobre o conhecimento científico e tecnológico desenvolvido no país”. Ainda segundo a mesma reportagem, o documento aponta que “os investimentos públicos em pesquisas e ações relacionadas à IA no Brasil devem alcançar R$22 bilhões até 2028. Segundo o levantamento, para cada real investido pelo setor público em IA, o setor privado contribui com R$3,34.”


Mulheres na Ciência

Destaca-se também a participação feminina na ciência, que segundo um relatório intitulado Em direção à equidade de gênero na pesquisa no Brasil,cresceu 29% em 20 anos. Além disso, em 2022, 49% da produção científica brasileira tinha entre os autores pelo menos uma mulher. Com isso, o país ocupa o terceiro lugar no mundo com maior participação feminina, ficando atrás apenas da Argentina e Portugal. Nas áreas conhecidas como STEM, acrônimo em inglês para  “Science, Technology, Engineering and Maths” (ciência, tecnologia, engenharia e matemática), também houve crescimento: de 35% em 2002 para 45% em 2022.

“São resultados encorajadores ao constatar que nas gerações mais recentes vem crescendo a participação feminina”, comenta o vice-presidente de Relações Acadêmicas da América Latina da editora Elsevier, Dante Cid, em entrevista à CNN Brasil.  “No entanto, ainda temos desafios a superar nos aspectos de participação nas Exatas e de participação entre as gerações mais experientes”, pondera. Isso porque, apesar do otimismo em relação aos resultados, a presença feminina diminui conforme a carreira avança; mulheres com até cinco anos de carreira foram co-autoras de 51% das publicações científicas, de acordo com o levantamento, que engloba dados de 2018 a 2022. Porém a participação cai para 36% entre aquelas com mais de 21 anos de carreira. As razões para isso são variadas: cai sobre mulheres a maior parte das respondabilidades domésticas - principalmente no que tange a questão de filhos -  além de questões culturais e discriminação no trabalho.

Por isso é imprescindível que as universidades abram espaço e criem iniciativas voltadas para a equidade de gênero, em especial para aquelas que são mães.


“Fuga de Cérebros” e Otimismo Comedido

A migração de talentos brasileiros para o exterior é outra fonte de preocupação daqueles que apoiam a ciência brasileira. O fenômeno chamado “fuga de cérebros” é uma consequência de salários baixos e alta cobrança. Por isso é comum que cientistas brasileiros busquem por ambientes com maior qualidade de infraestrutura e salários que reflitam seu real trabalho. O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) implementou programas específicos para evitar o êxodo de cientistas e estimular o retorno ao país daqueles que decidiram sair.

Nos primeiros dois anos de mandato do Presidente Lula foram implementadas uma série de medidas voltadas a reafirmar o Brasil no cenário científico internacional. Por isso houve uma recomposição orçamentária do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) além de alocação de recursos para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), que durante o governo anterior teve cortes significativos.

Houve também o reajuste do valor das bolsas de estudantes de iniciação científica e pós graduação, além das de mestrado, doutorado e pós-doutorado. Inclusive, foi constatado um aumento na produção de artigos neste ano (mais de 3.550 em relação à 2023), mostrando o reflexo das ações implementadas. A Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência, todavia, encara o cenário com cautela:

“A SBPC vê o ano de 2025 com um moderado otimismo porque sabemos que, por um lado, o Brasil voltou a trilhar o caminho bem-sucedido do necessário investimento na Ciência, na Educação, na Saúde, na proteção ao meio ambiente e na inclusão social. Mas, por outro lado, sabemos que a situação ainda está muito difícil devido, em boa parte, aos bloqueios colocados pela situação do orçamento da União. Portanto, os investimentos que esperávamos que houvesse não estão se revelando à altura do que se imaginava”, comenta Renato Janine Ribeiro, presidente da entidade.


O problema das Fake News

Segundo pesquisa do Instituto Locomotiva, quase 90% dos brasileiros admitem já terem caído em uma fake news. A maior parte delas era sobre venda de produtos e propostas eleitorais. Outra pesquisa, desta vez feita pelo Instituto DataSenado mostrou que metade dos brasileiros considera difícil identificar se uma notícia é verdadeira na internet.

Um caso que tomou grande repercussão aconteceu ano passado, quando Ana Bonassa e Laura Marise, divulgadoras científicas e donas do canal “Nunca Vi 1 Cientista” foram condenadas por desmentir um nutricionista que fez uma postagem alegando que o diabetes era causado por vermes. Além da desinformação, o dono do post ainda vendia "protocolos para desparasitação" como tratamento. Após o ocorrido, o STF anulou a sentença, argumentando que não havia justificativa para afastar o direito à informação e à expressão científica. Em suas redes sociais, elas comentaram a decisão em vídeo:

“Hoje a liberdade para fazer divulgação científica expondo quem desinforma ganhou mais uma batalha”, comentou Ana. Sua colega, Laura complementou: “Não somos as primeiras, nem seremos as últimas divulgadoras processadas, mas a gente optou por não ficar calada”.

Divulgar e fazer ciência no Brasil é um ato político e por isso não deve ser suprimido. O conhecimento produzido no país é fundamental para o progresso social e econômico. Por isso é tão importante o apoio da sociedade civil e do poder público em reconhecer o poder da ciência e fortalecer o cenário técnico-científico nacional. A luta dos pesquisadores não deve ser solitária, muito pelo contrário: lutar pela ciência e pela liberdade daqueles que a divulgam deve ser um compromisso de todos.


Referências Bibliográficas:


BIAGINI, Eduardo. Investimentos para fortalecer ciência e tecnologia chegam a R$ 26,3 bilhões em dois anos: Números foram apresentados pela ministra da Ciência e Tecnologia, Luciana Santos, que também falou sobre ações para promover inteligência artificial e inclusão de mais mulheres no setor. Agência Gov, [S. l.], p. 1-1, 18 dez. 2024. Disponível em: https://agenciagov.ebc.com.br/noticias/202412/investimentos-para-fortalecer-ciencia-e-tecnologia-chegam-a-r-26-3-bilhoes-em-dois-anos#:~:text=Investimentos%20para%20fortalecer%20ci%C3%AAncia%20e,em%20dois%20anos%20%E2%80%94%20Ag%C3%AAncia%20Gov. Acesso em: 19 maio 2025.


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COELHO, Thomaz. Cientistas são condenadas por desmentirem postagem sobre diabetes: Decisão determinou que vídeo educativo fosse apagado sob pena de multa e estipulou uma indenização por danos morais de R$ 1.000,00. CNN Brasil, [S. l.], p. 1-1, 13 set. 2024. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/cientistas-sao-condenadas-por-desmentirem-postagem-sobre-diabetes/. Acesso em: 19 maio 2025.


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CUNHA, Marcella. 80% dos brasileiros temem que notícias falsas influenciem eleições. Rádio senado, [S. l.], p. 1-1, 1 out. 2024. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/radio/1/noticia/2024/08/26/datasenado-80-dos-brasileiros-temem-impacto-de-fake-news-nas-eleicoes. Acesso em: 19 maio 2025.


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LOPES OLIVEIRA, Ronaldo. Brasil retoma sua produção científica com crescimento de 6%: Em artigo, o Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da UFBA, Ronaldo Lopes Oliveira, analisa a retomada da produção científica brasileira em 2024 após anos de cortes no orçamento do MCTI e destaca os primeiros resultados positivos de novos investimentos e políticas públicas.. Fundação Maurício Grabois, [S. l.], p. 1-1, 26 mar. 2025. Disponível em: https://grabois.org.br/2025/03/26/producao-cientifica-brasil-cresce-6/. Acesso em: 19 maio 2025.


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