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A Proposta de Reparação Histórica da Jamaica Sobre seu Passado Colonial


CORTESIA INSTITUTO MOREIRA SALLES

Proibição no tráfico negreiro não impediu que mais de 700 mil escravos fossem trazidos ilegalmente ao Brasil entre 1831 e 1850




Resumo

A Jamaica, país da América Central, sofreu ao longo de sua história uma longa exploração por parte do Reino Unido, sofrendo os danos do colonialismo até os dias atuais. O presente artigo visa apresentar o contexto da colonização da Jamaica e a atual conjuntura do país, que busca um acerto de contas com a metrópole que o explorou.


Palavras-chaves: Jamaica. América Central. Escravidão.


Abstract

Jamaica, a country in Central America, has suffered throughout its history a long exploitation by the United Kingdom, suffering the damages of colonialism until the present day. This article aims to present the context of the colonization of Jamaica and the current situation in the country, which seeks to settle accounts with the metropolis.


Key-words: Jamaica. Central America. Slavery.



Contexto Histórico


A Jamaica é um país caribenho, subdesenvolvido e pouco industrializado, foi a principal colônia do Império Britânico, para onde mais de 600 mil escravizados foram levados. Esse país, no período em que foi colonizado, tornou-se um dos maiores centros do tráfico negreiro para a América do Sul e, no século XVIII, o maior produtor de cana de açúcar. Sua independência foi obtida apenas em 1962, entretanto, ainda existem controvérsias acerca dessa independência, visto que o território ainda se trata de um reino da Commonwealth, assim, a rainha Elizabeth II é monarca e Chefe de Estado do país. Durante o tenebroso período colonial, africanos foram levados à força para o território jamaicano, onde sofreram “atrocidades sem precedentes para realizar trabalhos forçados em benefício do Império Britânico”, segundo Olivia Grange, a ministra dos Esportes, Juventude e Cultura da Jamaica, além da morte de cerca de 60 mil indígenas. Em consequência disso, cerca de 90% da população jamaicana é negra e descendente de africanos escravizados. Esses cidadãos jamaicanos, negros e afro-descendentes não possuem outro idioma além do inglês, perderam por completo o contato com a África, possuem uma perspectiva ocidental, com poucos resquícios culturais de seu berço genético (MÁS QUE PERDÓN…, 2021).

É de conhecimento geral que a colonização feita pelos países europeus renderam inúmeras atrocidades e cicatrizes para a América Latina e Caribenha, e para a Jamaica não foi diferente, embora esse contexto de genocídio e etnocídio, por muitos anos significou glória e orgulho nacional para os países imperialistas. O processo de abolição da escravidão foi muito lento e complexo, com ampla participação popular apoiando o movimento e pressão internacional e quando a abolição se concretizou o império britânico indenizou os proprietários de escravizados, enquanto estes, seres humanos que foram desumanizados, foram deixados à sorte. Se por um lado o fim da escravidão simboliza um grande avanço, por outro, vale destacar que na realidade as condições de vida dos negros permaneceram praticamente inalterados, trabalhando de forma análoga à escravidão por mais longos anos.

Nessa conjuntura, até o momento os países europeus de modo geral têm sido praticamente omissos para reconhecer o dano irreparável que cometeram em suas antigas colônias e aos povos que eles escravizaram. Embora alguns países, como a Alemanha, tenham oferecido desculpas diplomáticas pelos crimes cometidos, nunca houve uma reparação efetiva além de meras palavras. De acordo com o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), nenhum Estado assumiu de forma integral por sua truculência nem pelo consequente racismo sistêmico como legado da escravidão e do colonialismo. E qual seria o preço justo para pagar por extinguir centenas de milhares de vidas? (JAMAICA RECLAMA A…, 2021; MÁS QUE PERDÓN…, 2021).



A Reivindicação da Jamaica


Ciente desse passado colonial, a Jamaica há mais de dois anos é membro da comissão de nações do Caribe que busca preparar uma ação judicial contra os governos colonizadores em busca de reparações pela escravidão. Além disso, outros países como Burundi, Barbados e Namíbia também cobram que as velhas potências imperialistas reparem os danos que os regimes exploratórios provocaram às suas nações. O debate em questão envolve diversos fatores, sejam eles históricos, políticos, econômicos, valendo ainda ressaltar questões éticas e morais; nesse sentido, chegar a um consenso e a uma resposta concreta não é uma tarefa fácil. Esse debate ganhou força em meados de 2015, quando o Reino Unido, em pleno século XXI, finalmente encerrou o pagamento de indenizações aos proprietários de escravizados, ao passo que nunca se debateu ou colocou em cogitação o fato de se desculpar com aqueles que foram explorados (JAMAICA RECLAMA A…, 2021).

Diante dessa conjuntura, a própria ACNUDH, em seu relatório anual, incentiva os Estados a buscarem medidas concretas visando enfrentar as feridas históricas por meio de diálogos e negociações diplomáticas com a participação nacional, em especial de afrodescendentes. Após anos de debate entre os parlamentares e com outros países de um passado histórico semelhante, a Jamaica aparenta estar próxima de oficializar o pedido de reparação histórica de forma financeira. Adendo a isso, o anúncio coincide com o esforço de diversos setores sociais jamaicanos para romper mais drasticamente com as relações formais de submissão ao Reino Unido, em busca de se retirar da Commonwealth para que a rainha britânica deixe de ser a chefe de Estado do país (MÁS QUE PERDÓN…, 2021; JAMAICA PEDIRÁ Al…, 2021).

Sendo assim, o Estado jamaicano busca compensar um pouco o doloroso passado dos ancestrais de sua população através de uma compensação financeira. O autor da petição, o parlamentar jamaicano Mike Henry, estipula um valor de cerca de 10 bilhões de libras, valor que seria a soma, em valores atuais, com que o Reino Unido indenizou os donos de escravizados quando houve a abolição. Henry afirma que um acordo nesse valor compensaria razoavelmente a dívida incalculável da Grã-Bretanha por escravizar e lucrar com a colonização e a escravização, alegando que a demanda jamaicana é modesta. O legislador conta com o apoio dos dois partidos políticos do Estado, que é bipartidário, assim, o governo afirma que prosseguirá com a petição.



Considerações Finais


Atualmente, a ilha jamaicana se trata de um país subdesenvolvido, onde a principal atividade econômica é a plantação de cana-de-açúcar e a pecuária, que conta com um campo de trabalho restrito e taxas preocupantes de uso de mão-de-obra infantil. Outro setor importantíssimo na economia do país é o turismo, que alimenta uma cadeia de mercado regional, sustentando diversas famílias; entretanto, enfrenta uma grande problemática devido a restrição de circulação por conta da pandemia do Covid-19.

O país, então, passa por um período delicado de conflito social, ampliado pelo aumento da pobreza e alta taxa de homicídios. É inegável que o passado reflete diretamente no presente e que países imperialistas possuem grande parcela de responsabilidade pelo subdesenvolvimento não apenas da Jamaica como também de praticamente todo Sul Global. Países que tiveram suas terras esgotadas, humanos desumanizados, culturas apagadas e foram inseridos à força no sistema capitalista.

Embora a reivindicação jamaicana pareça não ter grande força no exterior e o Reino Unido há anos se mostrar insatisfeito com essa alegação, deixando implícito que não estão dispostos a uma reparação histórica seja ela de forma financeira ou por pedidos formais de desculpas, o debate em questão se mostra válido diante do fato de que as sociedades sofrem até atualmente com o racismo estrutural implantado em suas bases, além da condição financeira à qual esses povos foram submetidos. Os jamaicanos nativos possuem um ditado que diz “we likkle, but we tallawah” e pode ser traduzido como “somos poucos, mas somos poderosos” e devemos reconhecer sua força que, após séculos de exploração, ainda luta pelo reconhecimento e respeito de seu povo.



Referências Bibliográficas


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