DO PÚBLICO AO PRIVADO: O IMPACTO DAS PRIVATIZAÇÕES E A NECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO.
- Samantha G. D. Santos
- 25 de out. de 2024
- 6 min de leitura
RESUMO:
A privatização é um processo econômico que envolve a transferência de bens ou serviços estatais para a iniciativa privada. Historicamente, a privatização ganhou destaque no Brasil na década de 1990 a partir do Programa Nacional de Desestatização (PND). Exemplos notáveis incluem a privatização da Vale do Rio Doce, Eletrobrás e agora Sabesp. A fiscalização das privatizações é realizada muitas vezes por agências reguladoras e essa supervisão é essencial para evitar abusos e garantir a qualidade dos serviços.
Os benefícios e malefícios envolvidos nessa pauta necessitam ser pontuados para que haja uma análise crítica sobre esse processo que para muitos é eficiente, enquanto para outros é uma problemática.
PALAVRAS-CHAVE: Privatização; desigualdades; regulamentação; iniciativa privada; governo;

Seu Dinheiro, 2019
INTRODUÇÃO:
Por definição, privatização nada mais é que uma pauta econômica que visa a concessão ou venda de algum bem ou serviço estatal para alguma rede de viés privado, isso significa uma mudança estrutural e de acesso, ao mesmo tempo que também impacta diretamente a qualidade dos serviços oferecidos, geralmente é realizada por meio de leilões ou concessões.
Hoje em dia, esse processo afeta os mais diversos setores no Brasil, desde do âmbito da telecomunicação e transporte até saneamento básico, saúde e educação.
Essa pauta econômica, por sua vez, nos leva a uma polarização de opiniões. Por um lado, os neoliberais defendem que essa iniciativa é mais eficiente de um ponto de vista operacional e também mais positivo para a captação de investimentos. Em tese, não só haveria uma redução do Déficit Público e maior equilíbrio nas contas governamentais, como também haveria uma diminuição na corrupção. Enquanto os progressistas, acreditam que esse tipo de processo não só causa impactos econômicos negativos, como também acaba por escancarar as desigualdades sociais, pois a partir do momento em que à transferência de serviços essenciais para a iniciativa privada é possível que haja um acesso desigual a esses serviços.
No meio desse debate é possível trazer o seguinte questionamento, mesmo com os potenciais benefícios, faz sentido realizar a transferência de um serviço essencial de viés público para uma empresa de capital privado, sabendo- se que o principal objetivo dessa empresa privada é justamente o acúmulo de capital e não o bem-estar da população?

SINTAEMA - Sindicato dos trabalhadores em água, esgoto e meio ambiente do estado de São Paulo, 2023
DESENVOLVIMENTO:
Dando um breve contexto histórico, podemos dizer que esse fenômeno veio acompanhado de outras transformações sociais e evoluções complexas na economia do país. Ele se popularizou na década de 90 durante o governo de Fernando Collor, a partir da implementação do Programa Nacional de Desestatização (PND), que tinha por objetivo trazer uma modernização para economia ao mesmo tempo que reduzia o papel estatal. (Catálogo IPEA, 2024)
Na prática podemos citar vários exemplos, desde da privatização da mineradora Vale do Rio Doce em 1997, até a privatização da companhia de energia elétrica Eletrobras em 2022. Mas aqui, gostaria de exemplificar a partir da privatização feita pela Via Mobilidade em São Paulo, no ano de 2018.
A empresa de transporte faz parte do grupo Grupo CCR e assumiu por meio de concessão as operações da linha 5-Lilás do metrô e das duas linhas de trem, 8- Diamante e 9-Esmeralda, que anteriormente eram geridas pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). Desde o início e até atualmente as operações realizadas pela Via Mobilidade tem gerado problemas. As críticas variam desde a qualidade do serviço, atrasos, superlotação, mal funcionamento dos trens, descarrilamento, até problemas na manutenção e problemas em equipamentos, nos trens, nos trilhos, no sistema de alimentação elétrica e na sinalização. (PESCARINI, FÁBIO/ Folha de S. Paulo, 2023)
Na pesquisa de avaliação dos serviços prestados às Linhas 8 e 9, realizadas no 1º semestre de 2023, a empresa, pelo terceiro período consecutivo, obteve nota zero no índice de satisfação do passageiro. Quando comparadas ao período anterior (2º semestre de 2022) houveram quedas nos quesitos como rapidez e conforto na viagem e segurança contra acidentes. Segundo o contrato de concessão, para pontuar no parâmetro Índice de Satisfação do Passageiro (ISP) a concessionária precisa obter nota superior a 70% na Linha 8 e 57% na Linha 9, mas como os indicadores não foram atingidos, a Via Mobilidade recebeu pelo terceiro período consecutivo nota zero na avaliação dos passageiros. (CARLOS, JEAN/ METRÔ CPTM, 2023)

G1 - Globo, 2022
Com isso, levando em consideração os fatos mencionados anteriormente, podemos concluir que a afirmação “privatiza que melhora” nem sempre se confirma na prática.
Já em relação ao monitoramento e fiscalização, eles se dão a partir de uma série de regulamentos e agências reguladoras e de controle. A depender do setor envolvido na privatização há a supervisão por agências reguladoras independentes. Por exemplo, no caso de Enel, é feito, ou ao menos deveria ser feito, uma regulamentação por parte da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que é uma autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia. Essas agências, por sua vez, têm por objetivo resguardar as operações dentro dos patamares e normas estabelecidas no ato da venda. Já se o caso da privatização for uma concessão, ou seja, é estabelecido um contrato entre governo e empresa privada, os deveres, metas a serem atingidas, normas e potenciais penalidades (em casos de descumprimento ou irregularidade) são definidas perante contrato, o que em tese facilita a verificação contínua e monitoramento. Em outros casos as empresas privadas podem ser sujeitas a auditorias e/ou outros tipos de consultas, a fim de ser realizado uma fiscalização através de relatórios periódicos sobre a performance das mesmas. E também pode haver ouvidorias durante o processo de monitoramento. (RODRIGO, MÁRCIO/JusBrasil - 2020)
Esse monitoramento e fiscalização contínua se faz necessário para não só avaliar o desempenho dessas empresas, como também, evitar os monopólios privados.
CONCLUSÃO:
Portanto, chegamos a conclusão que problematizar o conceito de privatização requer uma análise crítica, quase que epistemologia das consequências socioeconômicas e políticas envolvidas no meio dessa medida. Essa análise deve considerar não só os resultados imediatos das privatizações, como também seus efeitos a médio/longo prazo. A implementação de regulamentação pós processo e a promoção de uma co-participação envolvendo a sociedade civil são essenciais para minimizar os riscos associados à privatização, garantindo que os benefícios sejam distribuídos de maneira mais equitativa e que sejam exponencialmente maiores que os malefícios envolvidos no decorrer desse processo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
FURLANI, BRUNA. Agora é a hora! Governo disponibiliza lista das estatais federais que estão em avaliação para serem privatizadas ou capitalizadas, 14 de fevereiro de 2019. Disponível em: https://www.seudinheiro.com/2019/empresas/veja-a-lista-das-estataisfederais-que-devem-ser-privatizada. Acesso em 18 de outubro de 2024.
BRASIL DE FATO. Como as privatizações contribuem para o aumento da desigualdade no Brasil e no mundo, 17 de janeiro de 2024. Disponível em: https://www.brasildefato.com.br/2024/01/17/como-as-privatizacoes-contribuempara-o-aumento-da-desigualdade-no-brasil-e-no-mundo. Acesso em 18 de outubro de 2024.
RODRIGO, MÁRCIO. Consequências das privatizações de empresas públicas à sociedade, 2020. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/consequencias-das-privatizacoesde-empresas-publicas-a-sociedade/929499724. Acesso em 18 de outubro de 2024.
CATÁLOGO DE POLÍTICAS PÚBLICAS. 1990 - Programa Nacional de Desestatização, última atualização da base de dados em 24 de junho de 2024. Disponível em: https://catalogo.ipea.gov.br/politica/413/programa-nacional-dedesestatizacao. Acesso em 21 de outubro de 2024.
CARLOS, JEAN. Via Mobilidade volta a receber nota zero no índice de satisfação do passageiro, 09 de julho de 2023. Disponível em: https://www.metrocptm.com.br/viamobilidade-volta-a-receber-nota-zero-no-indice-de-satisfacao-do-passageiro/
GUEDES, PHILLIPE. Satisfação de usuários com serviços das Linhas 8 e 9 de trens da Via Mobilidade cai à metade e atinge patamar de 1996, 13 de outubro de 2022. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2022/10/13/satisfacao-deusuarios-com-servicos-das-linhas-8-e-9-de-trens-da-viamobilidade-caia-metade-e-atinge-patamar-de-1996.ghtml. Acesso em 21 de outubro de 2024.
PESCARINI, FÁBIO. Via Mobilidade diz que recebeu trens com problemas e promete melhora nas linhas até fim de 2024, outubro de 2023. Disponivel em https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2023/10/apos-receber-trens-com-problemas-viamobilidade-preve-linhas-8-e-9-boas-no-fim-de-2024.shtml#:~:text=O%20sucateamento%20do%20sistema%20e,Paulo%2C%20em%20janeiro%20de%202022. Acesso em 23 de outubro de 2024.
SINTAEMA - Sindicato dos trabalhadores em água, esgoto e meio ambiente do estado de São Paulo. Pesquisa mostra que 45% são contra privatização de empresas públicas, 10 de abril de 2023. Disponível em: https://sintaemasp.org.br/noticias/pesquisa-mostra-que-45-sao-contra-privatizacao-de-empresas-publicas. Acesso em 23 de outubro de 2024.
SEU DINEHIRO. Sem dinheiro em caixa, governadores pretendem transferir para a iniciativa privada ao menos 100 ativos: Cardápio inclui desde setores tradicionais, como energia elétrica, rodovias, aeroportos e empresas de telecomunicações, até a concessão de mirantes, marinas, hotéis e casa de repouso. [S. l.], 7 jan. 2020. Disponível em: https://www.seudinheiro.com/2020/politica/privatizacoes-governos-do-estado-2020/. Acesso em: 18 out. 2024.
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