Manifestações em Cuba: O que está por trás da Instabilidade no País
- Bruna Spinola
- 11 de ago. de 2021
- 6 min de leitura

AFPF
Resumo
O contexto econômico, social e político de Cuba encontra-se em um período conturbado, agravado pela pandemia. Neste cenário cresce a insatisfação popular, gerando as manifestações recentes e o artigo busca analisar quais são as razões para a instabilidade no país.
Palavras-Chave: Crise econômica; Pandemia; Embargos econômicos.
Introdução
Desde o início do mês de julho, Cuba está vivenciando uma série de manifestações, que já são conhecidas como as maiores das últimas décadas. Os motivos pelos quais a população cubana foi às ruas pode ser explicado pela crise que o país está vivendo, agravada pela pandemia, de falta de alimentos e falta de vacinas contra a covid- 19, além do pedido dos manifestantes por liberdade e mudanças no governo.
As manifestações viralizaram e o presidente Miguel Díaz Canel posicionou-se contra os últimos acontecimentos que marcam o momento de instabilidade econômica e política , pois o país está passando pela pior crise econômica em 30 anos e diversas questões podem explicar o contexto atual cubano.
Desenvolvimento
Em 2002 Fidel Castro, presidente da época, realizou alterações na política econômica e as usinas de açúcar, um dos principais produtos exportados, consideradas menos produtivas foram fechadas a fim de impulsionar as demais, porém o resultado foi uma redução da produção e as toneladas que sobravam não seriam suficientes para suprir a demanda.
Outro ponto importante é que países como o Brasil, Equador e Bolívia, que durante anos recebiam com frequência médicos cubanos em seus países e pagavam o governo por seus serviços desenvolvendo um papel importante como fonte de dólares para Cuba, porém atualmente a mudança política destes países afetou na economia cubana devido a redução de solicitação dos serviços.
Venezuela e Cuba possuem boas relações há anos, e já houveram momentos em que o país contribuiu com aproximadamente 22% do produto interno bruto (PIB) cubano, porém a crise econômica venezuelana também influenciou na instabilidade do país centro-americano. Assim como a relação crítica com os Estados Unidos, que impõem os embargos econômicos ao país há décadas e na realidade funcionam como um bloqueio comercial contra Cuba.
Estes embargos iniciaram logo após a Revolução Cubana de 1959 e funcionam através de sanções impostas pelos americanos que bloqueiam e prejudicam as relações comerciais e financeiras de outros países com a ilha cubana. Durante os governos de Barack Obama e Raúl Castro, apesar destas leis ainda continuarem em vigor, houve uma breve retomada nas relações diplomáticas e portanto a flexibilização em medidas, como por exemplo liberdade aos presos políticos dos dois países, autorização de voos diretos entre os países, permissão aos americanos para viagens à Cuba e pôs fim ao limite de envio de dinheiro aos cubanos.
Porém com a chegada de Donald Trump ao poder em 2017, foram revertidas as medidas do governo anterior e também retomaram leis que não estavam vigentes há anos, como a Lei Helms Burton de 1996, que permite aos Estados Unidos punir relações comerciais de empresas de outros países com Cuba. Neste período também limitaram o envio de remessas, e por ser uma das fontes principais de renda dos cubanos contribuiu para o desequilíbrio da economia, portanto a dependência de divisas é um fator marcante neste cenário.
O bloqueio econômico prejudica diretamente a vida dos cubanos, principalmente no sistema de saúde, pois há dificuldade em obter medicamentos e insumos para a área farmacêutica. Dessa forma, o país precisa buscar outros meios de compra que aumentam os preços, pois geralmente conseguem em mercados mais distantes. Além dos altos custos, a população que precisa do sistema de saúde sofre com essa situação, sem conseguir realizar o tratamento adequado por falta de medicamentos. Periodicamente o governo envia um relatório para a Organização das Nações Unidas (ONU) relatando os prejuízos causados pelo bloqueio que hoje em dia já somam bilhões de dólares.
Grande parte da comunidade internacional votou contra as medidas impostas pelo embargo comercial em votação na ONU e atualmente com Joe Biden no poder, havia esperança por mudanças, porém não há sinalizações por parte do presidente americano de que isso irá acontecer, pois o mesmo até o momento não alterou nenhuma das leis impostas por seu antecessor. Após as manifestações em julho, Biden posicionou-se de forma impositiva ao solicitar que o governo cubano dê atenção aos pedidos da população e afirmou que o motivo da revolta do povo se dá devido à repressão e instabilidade econômica causadas pelo regime autoritário cubano.
Com o objetivo de se recuperar das dificuldades geradas pelos embargos econômicos, o presidente Miguel Díaz Canel propôs um novo plano econômico, o qual iniciou em janeiro deste ano. O plano conta com medidas que extinguiram o peso conversível (CUC) criado em 1964 com o objetivo de controle da circulação do dólar, e dessa forma as compras e vendas podem ser realizadas através de pesos cubanos (CUP) ou moedas estrangeiras. Houve também o aumento de salários e aposentadorias, porém os preços também aumentaram, logo continua sendo uma dificuldade para a população. Como as fontes de divisas foram afetadas, dificultou a compra de bens no exterior por parte do governo, como alimentos e produtos básicos de limpeza pessoal, portanto apesar da implementação de novas medidas econômicas, a população está sofrendo com o desabastecimento do país.
Como citado anteriormente, o contexto de crise em Cuba foi intensificado pela pandemia, pois afetou diretamente o turismo que era uma das maiores fontes de renda e em 2020 resultando numa queda de 11% do PIB cubano. Apesar de terem conseguido controlar o número de casos de covid-19 no ano passado e pelo sucesso na criação da própria vacina, desde junho de 2021, Cuba está passando por uma nova onda da doença destacada como uma das piores da América Latina. O processo de vacinação, que foi autorizado para começar em maio, inicialmente em regiões mais afetadas pela pandemia, não se mostrou suficiente para conter o alto índice de contágio e este cenário contribuiu na insatisfação das manifestações populares.
As manifestações iniciaram no dia 11 de julho e os cubanos protestavam pela falta de comida decorrente do desabastecimento no país, falta de vacinas e uma parcela da população pediu por mudanças no governo e liberdade. Apesar de terem acontecido de forma pacífica em alguns locais, houveram atos de vandalismo contra mercados locais e um hospital. Também foram noticiadas ações de repressão policial contra os manifestantes, deixando alguns feridos. O presidente Miguel Díaz Canez ainda que não tenha se posicionado a favor dos últimos acontecimentos, buscou se informar com os manifestantes e entender quais eram suas reivindicações e nos seus discursos explicou os motivos pelos quais a programação da vacinação está lenta e também afirmou que a crise econômica que o país está vivendo se dá pelo bloqueio econômico imposto pelos Estados Unidos
Conclusão
Como mencionado, há décadas não aconteciam manifestações deste nível que fossem contra o governo e é nítido que a conjuntura atual de Cuba está vivendo um período de instabilidade econômica, política e social, que é agravado pelos quase 2 anos de pandemia. As manifestações populares mostram a população exercendo seus direitos como cidadãos ao protestarem pelas exigências necessárias, pois estão sofrendo com o desabastecimento nas cidades, aumento do custo de vida e o lento processo de vacinação.
Apesar dos protestos não terem se prolongado por muitas semanas, com certeza foram marcantes para o cenário político cubano. De acordo com as últimas notícias não há sinalizações de que o governo irá realizar grandes mudanças de imediato, porém o presidente afirmou que continuará em busca de enfrentar e superar os prejuízos causados pelo bloqueio americano.
Em relação ao bloqueio, como citado ao longo do artigo apesar de ser duramente reprimido pelo governo, por demais países e pela ONU, essas sanções dificilmente serão retiradas ou reduzidas por parte dos americanos. Embora atualmente o contexto cubano não esteja favorável, há esperanças de que o processo de vacinação acelere, visto que estão utilizando vacinas produzidas em solo cubano, e logo o turismo conseguirá se recuperar gradualmente e voltará a aquecer a economia cubana.
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