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O Assassinato de Jovenel Moïse e a Conturbada Política Haitiana





Resumo


O Haiti, um dos países mais pobres da América Latina e que vive em um contexto de diversas crises políticas, econômicas e, principalmente, sociais, passa por um novo desafio após o assassinato de seu chefe de Estado, Jovenel Moïse. O presente artigo visa apresentar o contexto da execução de Moïse e a atual conjuntura do Haiti. Assim, há uma análise acerca da política haitiana e, em seguida, aborda o quadro em que a população do país se encontra.

Palavras-chaves: Jovenel Moïse. Haiti. América Central.



Abstract


Haiti, one of the poorest countries in Latin America and living in a context of various political, economic and, above all, social crises, faces a new challenge after the assassination of its head of state, Jovenel Moïse. This article aims to present the context of Moise's execution and the current situation in Haiti. Thus, there is an analysis of the Haitian policy and then discusses the situation in which the country's population finds itself.

Key-words: Jovenel Moïse. Haiti. Central America.



O assassinato de Jovenel Moïse


Em 7 de julho o presidente do Haiti, um dos países mais pobres da América Latina, foi encontrado morto em sua residência com 12 tiros, com seus aposentos saqueados e há indícios de que ele tenha sido torturado, chocando o país e toda comunidade internacional. As autoridades haitianas imediatamente iniciaram a busca contra o grupo de homens fortemente armados que invadiram a casa e os possíveis mandantes do crime. Um aspecto surpreendente foi a extrema facilidade com que a residência presidencial foi invadida, o que levou à detenção do chefe de segurança de Moïse, Dimitri Herard (JOVENEL MOÏSE: 4…, 2021; O QUE SE…, 2021).

Por sua vez, a Polícia da Colombia, que acompanha os interrogatórios dos ex-militares capturados, identificou que Joseph Felix Badio, ex-funcionário do Ministério da Justiça do Haiti, seria o mandante do assassinato. Além disso, sabe-se que mais de duas dezenas de colombianos estão envolvidos no ataque, sendo que 18 colombianos já estão presos, três foram mortos e outros três já identificados permanecem foragidos. Outro fator de destaque é que os colombianos envolvidos, em grande maioria, são militares aposentados, com amplo domínio da língua inglesa e têm treinamento em armamentos sofisticados, inteligência e operações internacionais, e muitos deles integravam unidades de contra-guerrilha financiadas pelos Estados Unidos (ASSASSINOS DO PRESIDENTE…, 2021; HAITI, A INDÚSTRIA…, 2021; COLÔMBIA AFIRMA QUE…, 2021).

Segundo gravações da investigação, o crime teria sido planejado em uma reunião em Miami, nos Estados Unidos, onde Christian Emmanuel Sanon foi o autor intelectual do crime - e já está detido. Há também o possível envolvimento de duas empresas estadunidenses, a Worldwide Investment Development Group e a CTU Security, que teriam sido contratadas para enviar armas e treinar os paramilitares colombianos. Calcula-se que o valor total da operação da execução do presidente tenha sido de US$ 83 bilhões (cerca de R$456 bilhões) - valor que ironicamente seria mais do que suficiente para acabar com a crise humanitária no Haiti (NOVO AMANHECER PARA…, 2021).

É evidente que mesmo antes do assassinato do presidente Moïse o Haiti já sofria imensamente com a instabilidade política, havendo diversos protestos que pediam a renúncia do mandatário, visto que as eleições parlamentares deveriam ter sido realizadas em 2019, mas Moïse adiou a eleição e continuava governando por decreto. Há ainda que se levar em consideração a constante condição de pobreza e problemas sociais nas quais o país está envolvido, assim, a morte de Jovenel Moïse agrava ainda mais a crise institucional em que o Haiti está imerso (PRESIDENTE DO HAITI ASSASSINADO…, 2021).



Contexto Histórico


Referente a isso, vale retomar a conjuntura em que o Haiti está inserido, buscando compreender um pouco melhor quais seriam as possíveis causas e consequências da morte desse chefe de Estado. Em fevereiro de 2021, Jovenel Moïse, então presidente do país, deu uma entrevista à revista El País, na qual acusava uma tentativa de golpe de Estado que estaria sendo organizado por um grupo de famílias e empresários, além de criticar fortemente o que ele denomina como oligarcas corruptos. Moïse, apesar de ter vencido as eleições logo no primeiro turno, só foi oficialmente reconhecido como presidente pelas autoridades oficiais um ano depois, por isso, defendia que deveria permanecer por mais um ano no poder - seu mandato em tese acabaria no fim de 2019 - mostrando a fragilidade institucional do Estado (PRESIDENTE DO HAITI, JOVENEL…, 2021).

Adendo às questões políticas conturbadas que o povo haitiano enfrenta, é evidente que a isso se somou a pandemia de Covid-19, ressaltando que se trata de um dos únicos países que ainda não aplicou nenhuma dose de vacina contra o coronavírus, além de outros problemas que o país já enfrentava há décadas como questões de catástrofes ambientais (furacões e terremotos que não raramente devastam o país), uma forte onda de violência urbana e alta porcentagem de pobreza de sua população. O país está sitiado por gangues armadas que disseminam o terror cometendo inúmeros assassinatos, sequestros, roubos e estupros (PRESIDENTE DO HAITI, JOVENEL…, 2021).

De acordo com relatórios de órgãos internacionais, mais de 60% dos haitianos vivem com apenas dois dólares por dia, ou seja, mais da metade da população vive em condição de extrema pobreza o que a Unicef classifica como a “pior crise humanitária dos últimos anos”. A pandemia castigou ainda mais a empobrecida economia do Haiti, que depende em 75% da cooperação internacional e que a ONU situa no 170º lugar entre 187 países no índice de desenvolvimento humano. Nesse sentido, a crescente onda de miséria e medo que atinge a população tem causado um aumento de migração, o que preocupa os Estados Unidos (DELINQUÊNCIA E POBREZA…, 2021; INSTABILIDADE POLÍTICA NO…, 2021).



O Haiti Após o Assassinato do Chefe de Estado


O Senado haitiano nomeou Joseph Lambert, atual chefe da Câmara Alta, como presidente interino do Haiti e negou a autoridade do primeiro-ministro interino, Claude Joseph. Como já havia o contexto instável de que as eleições deveriam ter ocorrido em 2019, assim, a Câmara dos Deputados e parte do Senado deveriam ter sido renovados, além de que o presidente pouco antes de sua morte estava nomeando um novo primeiro-ministro, houve conflito para decidir quem seria o presidente interino (JOSEPH LAMBERT É…, 2021).

As autoridades haitianas pediram ajuda aos Estados Unidos e às Nações Unidas para a garantia da segurança e de maior estabilidade. Entretanto, há uma grande rejeição da população haitiana a essa alternativa, visto que a Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (MINUSTAH), que foi uma missão de paz criada pelo Conselho de Segurança da ONU em 2004 e durou até 2017, teve resultados desastrosos que envolveu escândalos de abusos sexuais, abusos de poder, uso indiscriminado da violência e disseminação de doenças por parte das tropas denominadas capacetes azuis. Dessa forma, a ação da ONU remete a uma lembrança recente de raiva e indignação por parte da população (INSTABILIDADE POLÍTICA NO…, 2021; MORTES POR CÓLERA…, 2020).

Além disso, como agravante, há uma forte ameaça vinda de gangues criminosas, com destaque para a liderada por Barbecue Cherizier, que emitiu um comunicado prometendo vingança ao grupo de oligarcas que foram apontados por Jovenel Moïse, antes de morrer, de estarem planejando um golpe de Estado. Barbecue agrega o ódio a um grupo de famílias de origem árabe, provocando a ideologia xenofóbica aos cidadãos de origem sírio-libanesa do país que, segundo ele, controlam a economia tomando o lugar dos caribenhos (GANGUES DO HAITI…, 2021).



Considerações finais

Nessa conjuntura, é evidente que a crise econômica, política e social enfrentada pelo país tende a se agravar, não havendo soluções previstas para um curto prazo. A intervenção de outros atores da comunidade internacional, embora pareça ser uma solução para a insegurança, na verdade se mostra como uma faísca que pode explodir uma revolta popular ainda mais grave e feroz contra as autoridades. Por outro lado, é evidente também que os líderes políticos nacionais se mostram incapazes de resolver a questão, ainda mais com a disputa de poder e divergências ideológicas. Nesse sentido, espera-se que Joseph Lambert saiba controlar a situação da melhor forma e que as eleições, marcadas para setembro, ocorram de forma idônea, democrática e transparente, para que assim, o novo presidente eleito possa assumir e cumprir com os anseios da população e recuperar o fôlego desse país que tanto sofre.



Referências Bibliográficas


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