Os Desastres Naturais do Haiti e o Fracasso das Ajudas Humanitárias
- Bruna P. F. Spinola
- 9 de set. de 2021
- 6 min de leitura

Mulher haitiana chora ao passar por uma casa destruída em Les Cayes, cidade haitiana, após terremoto - Reginaldo Louissaint. 14 ago 2021 - AFP
Resumo
Ao analisar desastres naturais, é importante verificar o posicionamento da comunidade internacional em relação ao envio das ajudas humanitárias e se estas tiveram resultado. Neste sentido, o artigo analisa o contexto atual do Haiti, que está revivendo a pior crise humanitária.
Palavras-Chave: Desastres naturais; Ajuda Humanitária; Comunidade Internacional.
Introdução
Em janeiro de 2010, o Haiti foi devastado por um desastre natural de proporção catastrófica deixando mais de 200 mil pessoas mortas, 300 mil feridos e grande parte da população desabrigada. Foram longos dias de busca por sobreviventes e neste período o país vivenciou a pior crise humanitária, diversas residências, hospitais, escolas, e a infraestrutura do país como um todo foi destruída ou danificada. Logo, os haitianos começaram a viver em acampamentos improvisados, os quais não possuíam acesso eficiente a serviços essenciais, como abastecimento de água e alimentos.
A capital Porto Príncipe foi o local mais afetado e o aeroporto, que naquele momento era de extrema importância para possibilitar a chegada de ajuda humanitária, também teve pontos destruídos. Antes da tragédia, a situação econômica e social do país estava em estabilização, porém após o acontecimento que marcou a vida dos haitianos, depois de perderem seus familiares, suas residências, locais onde trabalhavam, onde estudavam, e tantas outras perdas irreparáveis, a população encontrava-se em situação de extrema pobreza.
Onze anos depois, o povo haitiano vive o mesmo pesadelo, pois no dia 14 de agosto de 2021, o país foi atingido pelo terremoto de magnitude 7,2 e pela tempestade tropical Grace. Apesar de todo país ter sentido o tremor, algumas regiões foram as mais afetadas e desta vez a capital não está entre estas. A tempestade da última semana dificultou ainda mais o processo de resgate e até o dia 20 de agosto, pelo menos 2.000 mortes foram registradas e 30 mil pessoas estão desabrigadas, sobrevivendo nos abrigos improvisados e nas ruas.
Neste contexto, muitas comparações entre os dois desastres naturais estão sendo feitas, as quais são importantes para conseguir prever quais serão as possíveis consequências deste acontecimento para a população haitiana, como também o que a comunidade internacional pode fazer para amenizar os danos gerados pelos desastres.
Desenvolvimento
Ainda em 2010, o país caribenho viveu uma epidemia de cólera, doença bacteriana a qual não havia sido detectada no país há cem anos e matou milhares de haitianos. Há muitos questionamentos sobre o motivo que desencadeou o surto da doença no país e há relatórios que indicam os soldados da ONU, como os responsáveis por levarem a bactéria, no momento em que estavam nas missões de paz. Como a Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti (MINUSTAH), fundada em 2004 e passou a ter o controle do país com mais de 7 mil soldados e policiais até 2017, momento em que foi encerrada a missão.
Ao analisar o contexto haitiano após os desastres naturais e sanitários, é importante verificar como foi o posicionamento da comunidade internacional neste momento e como se deu a ajuda humanitária. Neste contexto de crise, muito se fala sobre o fracasso das missões de paz, que tem o objetivo de cooperar na reestruturação de uma nação muito afetada, as quais já não estavam demonstrando sucesso há anos. É possível verificar que, apesar do país ter recebido apoio da comunidade internacional para se restabelecer, recebendo voluntários e médicos, é nítido o mal desempenho da ajuda humanitária prestada ao Haiti.
Alguns exemplos são a intervenção estrangeira do Fundo Monetário Internacional (FMI), que havia prometido empréstimo de 14 milhões de dólares ao país, e deveriam ser devolvidos após 5 anos. Porém a população haitiana nunca recebeu tal quantia, pois 90% do financiamento foi destinado a organizações estrangeiras, restando apenas a dívida externa desta “ajuda humanitária”, conhecida como ajuda fraudulenta. Como também a promessa por parte dos Estados Unidos e França que haviam se comprometido pela reconstrução do hospital público, no entanto não deram continuidade e até o momento as regiões mais afetadas não estão perto da reconstrução por completo.
Durante esses anos, o Haiti esteve em constante busca pela restauração, e após um tempo foram construídas moradias simples para que a população não continuasse nos acampamentos, os quais foram montados inicialmente para abrigo. Porém, mesmo nessas novas moradias, as quais não haviam sido construídas para toda a população, os 32 mil sobreviventes do terremoto continuavam vivendo em situação precária, sem saneamento básico ou segurança. Além da crise humanitária, também ocorreram conflitos políticos e diversas empresas foram à falência, fatos que agravaram a situação econômica e a instabilidade do país.
Com a recente notícia da nova tragédia do país que se juntou a crise sanitária, causada pela pandemia de covid-19, e com a crise política agravada pelo assassinato do presidente Jovenel Moise em julho deste ano, é necessário o questionamento se os erros antigos em relação à ajuda humanitária serão cometidos novamente, custando a vida dos haitianos.
No momento, a população está fazendo o possível pela sobrevivência, há uma parcela que está construindo abrigos temporários em terrenos vazios, e outros estão ajudando em centros de reabilitação improvisados por parte da população com alguns voluntários. Estes locais estão recebendo vítimas feridas, visto que os hospitais estão lotados e não estão em boas condições, somente entregando produtos de higiene pessoal para a população.
Os haitianos estão vivendo dias horríveis, com as cidades mais afetadas desabastecidas, vivendo em locais alagados pela forte chuva, e com muitos feridos sem a possibilidade do devido tratamento médico. Até o momento, estão sobrevivendo sem a atuação do governo e do apoio da comunidade internacional, portanto a população sente-se abandonada, e há o questionamento se a ajuda chegará até eles.
Na segunda feira 23 de agosto, houve uma reunião do Conselho de Segurança da ONU para debater a situação humanitária no país, e através do relatório postado pela ONU News - Perspectiva Global Reportagens Humanas, foi informado a necessidade urgente de doações em milhões de dólares e envio de reforços para atender a situação que se agrava rapidamente. Porém, também pontuam a insegurança para a entrada dos comboios humanitários, pois acreditam que as estradas estão cercadas de criminosos nas principais entradas das cidades. Desse modo, informam na postagem que a meta será criar um conjunto de ações com apelo de urgência.
Conclusão
Tendo em vista as consequências do desastre natural de 2010, e a dificuldade do Haiti em se reconstruir com a ajuda limitada recebida por parte da comunidade internacional, que ao invés de assistência e suporte, trouxe ao país mais dívidas, é necessária a reflexão de quanto maior for a espera para envio de recursos, mais vidas serão perdidas.
Apesar do posicionamento do conselho de segurança da ONU referente a insegurança da entrada dos comboios humanitários ser relevante, levando em consideração o período de instabilidade política que o país está vivendo, agravado pelo assassinato do presidente, fato que aumentou a tensão na ilha caribenha gerando o aumento dos casos de crimes. Contudo, no contexto atual do país, devastado pelos desastres naturais e a pandemia, que até junho deste ano estava propagando-se em ritmo alarmante, é imprescindível a necessidade de atuação da comunidade internacional.
É necessário o envio de reforços com médicos voluntários nas áreas mais afetadas, uma vez que há muitos sobreviventes com ferimentos graves, doações de produtos básicos de higiene pessoal, água e alimentos, pois as cidades estão desabastecidas, como também doações financeiras para auxiliar o país a iniciar a sua reestruturação novamente. De acordo com as notícias, há posicionamentos do governo de países como o Brasil que irão enviar auxílio para o resgate às vítimas. Em nota, no dia 18 de agosto o Ministério das Relações Exteriores confirmou o envio de missão humanitária ao Haiti, com bombeiros especializados em resgate e kits hospitalares, demonstrando ação importante a ser realizada também por outros países.
Há esperanças das ajudas humanitárias prestadas atualmente ao Haiti, terem efeitos significativos se comparados com a tragédia de 2010, porém os países e, principalmente, as grandes organizações, precisam atuar com carácter de urgência. Pois a situação é alarmante e, como já visto nos últimos anos, as consequências se alastram para o resto da vida, devido a dificuldade de um país em se reconstruir novamente sem a ajuda necessária.
Referências Bibliográficas
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