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Peru em Crise: Déficit na Economia e Eleição Presidencial.





Mamani, Carlos. 2021




Resumo


A pandemia da COVID-19 agravou ainda mais a situação econômica e política do Peru que já mantinha uma instabilidade em virtude dos quatro últimos governos. Em consequência houve uma redução do seu Produto Interno Bruto (PIB), elevando em 13% a taxa de desemprego e deixando 20,5% de toda população peruana em nível de pobreza.

As eleições à presidência no país iniciaram em junho desse ano contando com a disputa entre dois candidatos: de um lado Pedro Castillo, esquerdista socialista, e em contrapartida, Keiko Fujimori, representante da direita. Independente do novo governante, o vencedor receberá um ambiente complicado e dependente das relações internacionais para recuperar a sua economia.

Após a apuração dos votos, a vitória de Castillo não foi bem aceita e a adversária pede recontagem e anulação de centenas de urnas, causando a indignação dos indígenas e de comunidades majoritariamente excluídas.

Palavras-chave: Economia. Keiko Fujimori. Pedro Castillo. Peru. Presidente.



ABSTRACT


The COVID-19 pandemic further aggravated the economic and political situation in Peru, which was already unstable due to the last four governments. As a result, there was a reduction in its Gross Domestic Product (GDP), raising the unemployment rate by 13% and leaving 20.5% of the entire Peruvian population in poverty.

Elections for the presidency in the country began in June of that year with a dispute between two candidates: on the one hand Pedro Castillo, a socialist leftist, and on the other hand, Keiko Fujimori, a representative of the right. Regardless of the new ruler, the winner will receive a complicated environment dependent on international relations to recover their economy.

After counting the votes, Castillo's victory was not well accepted and the opponent asked for the recount and annulment of hundreds of ballot boxes, causing the indignation of the indigenous people and the mostly excluded communities.

Keywords: Economy. Keiko Fujimori. Pedro Castillo. Peru. President.

Referencial Teórico

O Peru é considerado um dos casos de maior fragmentação política em um país, em virtude da dupla posição: de um lado a representação nacional (os partidos) e a subnacional, em contrapartida, aos variados movimentos regionais e locais que disputam entre eles os cargos de maior autoridade; apesar de transitar sem problemas por quatro processos eleitorais subnacionais – 2002 a 2014 – e por quatro processos eleitorais presidenciais – 2001 (Toledo), 2006 (Gracía), 2011 (Humala) e 2016 (Kuczynski). Nos últimos anos, o país passou por uma sucessão de presidentes investigados por corrupção.

Considerada a sexta economia da América Latina, o país finalizou 2020 com uma redução de 15% do seu Produto Interno Bruto (PIB) – uma das maiores taxas registradas na região. Com a sua atividade econômica sendo baseada nos recursos naturais, como ouro, cobre, gás e no turismo, a crise política somada com a instabilidade econômica trouxe de volta o desemprego que alcançou uma taxa de 13% em janeiro e uma queda salarial de cerca de 12%, tornando a pobreza para 6,4 milhões de peruanos, correspondendo a 20,5% da população total, de acordo com o Instituto Peruano de Economia (IPE). O país prossegue com a instabilidade visto que acompanham uma crise social e política, evidenciada pela demissão dos quatro últimos líderes.

O Peru possui uma das taxas de mortalidade mais altas entre os 20 países mais afetados pelo Coronavírus, segundo a Universidade Johns Hopkins, dos Estados Unidos. Os números de óbitos estão sendo revisados por um grupo técnico constituído por especialistas de entid ades públicas e privadas peruanas juntamente da Organização Mundial da Saúde (OMS). Eles propuseram a modificação dos registros após atenderem sete critérios técnicos estabelecidos envolvendo casos confirmados, casos prováveis, casos que apresentem vínculo epidemiológico com algum infectado, ou que apresente um quadro clínico compatível com o Sars-Cov-2, afirma Violeta Bermúdez, presidente do Conselho de Ministros do Peru em anúncio à coletiva de imprensa na segunda-feira, 31 de maio.

Diante desse cenário, o próximo Governo herdará um ambiente complexo, que para se recuperar será necessário depender do comércio exterior e de uma ação de vacinação ágil, além da união de todos os membros dos diferentes partidos políticos.

Há um ano o país anunciou uma ajuda emergencial econômica em torno de 12% de seu PIB, no entanto, durante o segundo semestre do ano a economia despencou em 30% e parte da população mais vulnerável não obteve a ajuda por executar trabalhos informais. Segundo o analista de risco creditício da dívida soberana do Peru na agência de qualificação Moody’s, Jaime Reusche:

“Ficamos muito preocupados pelo fato de que esta eleição está causando muito debate sobre um modelo que serviu tão bem ao país, mas que vem sendo questionado, e que está à beira do abismo, em relação a possíveis mudanças constitucionais, por um giro das políticas públicas a um pouco mais de populismo, maior irresponsabilidade fiscal e um pouco de hostilidade ao setor privado”.

E ainda acrescenta sobre o processo de recuo em relação às conquistas de empregos formais que será perdida, ocasionando insatisfação na população:

“[...] estamos falando de um retrocesso de quase uma década, em relação a progresso social, porque era dado como certo que muito desse crescimento econômico chegaria e se infiltraria em muitos setores da população, não todos, mas uma grande quantidade deles, que receberam maiores rendimentos e melhores oportunidades”.

Uma primeira alternativa para o novo Governo é Pedro Castillo, mesmo quando candidato havia sido condenado por fraudes contra o Estado, representante da “esquerda socialista” e da ortodoxia, contrário a aprovação de direitos civis diante do casamento igual entre pessoas do mesmo sexo e do aborto, que atualmente é permitido apenas em situações de risco à vida da gestante ou do feto.

Ele prometia, segundo um documento divulgado por seu partido Perú Libre – que se coloca como "marxista-leninista-mariateguista" - uma reforma da Constituição, esta proposta estimulou protestos massivos no país em novembro de 2020, a reforma tinha como fim estabelecer uma economia popular com o mercado de maneira "solidária, humanista, salvadora e nacionalizadora".

Contando com a distribuição das reservas cambiais do país à população peruana, estatização total da produção petróleo e demais setores, dentre outras propostas para um “novo” governo socialista. O partido afirma que

"A nova Constituição deve ser elaborada por meio de uma Assembleia Constituinte, a mesma que deve concluir no desmantelamento do neoliberalismo e capturar o novo regime econômico do Estado".

De outro lado a adversária, Keiko Fujimori, filha do ex-presidente ditador, Alberto Fujimori, condenado a 25 anos de prisão por corrupção e crimes contra a humanidade durante seu governo - como esterilização forçadas de mulheres e extermínio de seus oponentes - com o desejo de ganhar as eleições, a concorrente buscava reagrupar a direita e considerava indultar seu pai.

Em março desse ano, José Domingos Pérez, promotor do caso Lava Jato no Peru, acusou a conservadora Fujimori por lavagem de dinheiro, organização criminosa e obstrução na Justiça, e solicitou ao juiz sua prisão preventiva por infringir uma das normas de liberdade vigiada, além de se comunicar com testemunhas do caso. Anteriormente o promotor já havia solicitado 30 anos de prisão para a candidata por ter supostamente embolsado 1,2 milhão de dólares da Odebrecht – transnacional brasileira – para utilizar em suas campanhas eleitorais nos anos de 2011 e 2016, não declarando esse valor. Com isso o promotor afirmou através de texto que:

“foi determinado novamente que a acusada Fujimori Higuchi viola a restrição de não se comunicar com as testemunhas. Constatou-se como fato público e notório que ela se comunica com a testemunha Miguel Torres Morales”.

Caso a conservadora ganhasse o título da presidência obteria proteção enquanto estivesse no cargo, entretanto esse processo de lavagem de dinheiro prosseguiria com outros acusados, incluindo seu esposo Mark Vito Vilanella, sua advogada Giuliana Loza e seus dois assistentes. Outra vantagem, seria o congelamento de outras investigações contra membros de sua família.

Após encerrada as apurações no domingo de 6 de junho, Castillo se sobressaiu com 50,18% contra 49,82% da opositora, restando a contabilização de apenas 1% das atas e cerca de 60 mil votos de diferença. Insatisfeita com o resultado, a conservadora Fujimori denunciou “indícios de fraude” e solicitou a revisão de 800 urnas, estendendo o resultado final por volta de mais duas semanas. Ainda assim, o esquerdista já foi cumprimentado por outros presidentes da região, como o argentino Alberto Fernández e pelo ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva.

O Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, discursou da quarta-feira, 9 de junho, durante um culto evangélico na igreja Church in Connection na cidade de Anápolis (GO), lamentando a vitória de Castillo.

"Perdemos agora o Peru. Voltou, pelo que tudo indica, falta 1% de apuração lá, só um milagre pra reverter, vai reassumir lá um cara do Foro de São Paulo [organização de esquerda]".

Bolsonaro também se manifestou sobre outros países vizinhos administrados por governantes de esquerda.

"Olha para onde foi a nossa Venezuela, quando se começou a acreditar nas coisas fáceis. Um país riquíssimo, como a Venezuela, em petróleo e ouro. Olha para onde eles foram, tendo em vista a ideologia que estão seguindo. Olha para onde está indo a nossa Argentina. Só um milagre para salvar a Argentina. Perdemos agora o Peru [...] vai reassumir um cara do Foro de São Paulo. Olha a nova Constituinte do Chile."

O Peru possui um dos sistemas eleitorais mais transparentes de todo o mundo e os resultados das 86 mil mesas distribuídas pelo território são publicadas no portal do Escritório Nacional de Processos Eleitorais (ONPE – sigla em espanhol). As atas são obrigatoriamente assinadas pelos delegados, empregados e gestores de cada partido. Na hipótese de a assessoria dos candidatos não aprovar alguma delas, é possível solicitar a análise novamente ou argumentar diretamente. Em vista disso, sendo o Jurado Nacional Eleitoral a primeira instância do tribunal eleitoral, as queixas são examinadas por ele a fim de determinar a validação ou não. Prosseguindo a insatisfação do concorrente, é possível enviar a reivindicação à segunda instância, ao plenário do tribunal eleitoral, que possui o poder do desenredo. Desta forma, o sistema se desenrola lentamente até a conclusão do caso.

Enquanto ocorria o processo de revisões das urnas, alguns indígenas alertam que continuariam chegando a Lima e que lutariam pelo respeito aos seus votos em favor de Castillo, por considerarem que os pedidos de anulação são uma forma de racismo e discriminação, levando em conta também que a lenta apuração das eleições presidenciais mantém o país em vigília e polarizado.

Após a tensão política e algumas críticas ao JNE sobre um “golpe de estado”, principalmente por parte do candidato presidencial de esquerda, Castillo, foi anulado na sexta-feira, 11 de junho, a prorrogação do prazo da revisão dos votos das eleições, dado que a decisão não havia sido publicada oficialmente. Quatro membros do júri votaram pela reconsideração enquanto apenas um se fez contra, sendo este o procurador supremo Luis Acre.

Com a vitória de Pedro Castillo, pela primeira vez o Peru será presidido por um partido de esquerda. O candidato fez campanhas prometendo elevar os impostos sobre a mineração de cobre, causando pânico na elite peruana que, mesmo antes das apurações, já iniciaram um movimento de transferência de capital ao exterior, dividiram propriedades entre parentes e até retiraram dinheiro em espécie para guardá-lo em casa em maletas.

Mesmo em seus discursos contra o establishment (termo em inglês que caracteriza uma classe social, econômica e política que possui poder sobre a sociedade), sendo a favor das camadas esquecidas a fim de promover uma nova Constituição mais inclusiva e renegociar contratos com empresas estrangeiras, existem outras propostas ultraconservadoras, como posicionamentos contra a imigração, à igualdade de gênero e direitos LGBTQ+.



Considerações Finais


O Peru faz parte do acordo do Tratado de Livre Comércio (TLC) com o Chile, China, Japão, Panamá, Tailândia, União Europeia e NAFTA (Canadá, Mexico e Estados Unidos), e mesmo após o desgaste dos últimos mandatos é possível visualizar que seu modelo econômico possui mais vantagem que a média da região. Ainda que a economia do país tenha previsão de alta de 10% do seu PIB no ano de 2021, de acordo com um pronunciamento do Governo, a desigualdade social prossegue em pauta. A bolsa de valores da Capital despencou cerca de 7% após Castillo assumir a liderança na apuração oficial das urnas.

Antes mesmo do resultado das eleições, a vantagem de Castillo foi quase que unânime, causando reboliço e preocupações à direita e à elite, que temem a implantação do “comunismo”. Assim, o professor rural assumirá um trono problemático e historicamente preocupante apesar das propostas e campanhas inclusivas, visto que terá de ser diplomático e estar preparado para a oposição.

Conforme o banco J.P. Morgan, o decorrer do mandato de Castillo, esquerdista do Perú Libre, pode impactar diretamente no Banco Central peruano resultando no remodelamento da política e a fuga de capitais – como já está sendo evidenciado, apesar de haver uma estimativa muito baixa para mais reviravoltas.



Referências Bibliográficas



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